Apresentação Power Point com informações sobre o Renascimento.
***Novelas que inspiraram os trechos selecionados do filme***
Quarta novela da sétima jornada
O rei, percebendo que a história
de Elissa chegara ao fim, voltou-se sem demora para Lauretta, dando mostras de
que gostaria que ela contasse uma história; e ela, sem tardar, assim começou:
– Ó Amor,
quantas e quais são as tuas forças! Quantas ideias e quantas astúcias! Que
filósofo, que artista jamais poderia ter ensinado os argumentos, as astúcias,
as demonstrações que ensinas de repente a quem segue teus passos? Sem dúvida a
doutrina de qualquer outro é lerda em comparação com a tua, como muito bem se
pôde compreender das coisas anteriormente narradas. E a elas, amorosas
senhoras, acrescentarei uma de que se valeu uma mulher simples, de modo que não
sei quem mais poderia ter-lhe ensinado, a não ser o Amor.
Houve em
Arezzo outrora um homem rico que se chamava Tofano. Foi-lhe dada por esposa uma
belíssima mulher, cujo nome era monna Ghita, de quem ele, sem saber por quê,
logo começou a sentir ciúmes. A mulher, quando o percebeu, ficou muito zangada
e, embora várias vezes lhe perguntasse a razão de seu ciúme, ele nunca soube
indicar-lhe nenhuma, a não ser motivos gerais e infundados, de modo que ocorreu
à mulher fazê-lo morrer da própria doença que ele tanto temia sem razão. E,
percebendo que era cortejada por um jovem muito distinto, segundo lhe parecia,
começou a entender-se discretamente com ele. Quando entre os dois as coisas
tinham avançado a tal ponto que só faltava levar a efeito as palavras com
obras, a mulher ficou pensando em como encontrar meios também para isso. E, tendo
já percebido entre os maus costumes do marido o gosto pela bebida, não só
começou a elogiar esse hábito como também a incitá-lo astuciosamente a beber
com muita frequência. E acostumou-se tanto a isso que, quase sempre que tinha
vontade, fazia-o beber até embriagar-se. Quando o via bem bêbado, punha-o a
dormir, e assim se encontrou com o amante pela primeira vez e depois continuou
a encontrar-se várias outras em segurança. E tanta confiança tomou na
embriaguez do marido que não só chegou ao atrevimento de levar o amante à sua
casa como também de passar às vezes grande parte da noite em casa dele, que não
era muito distante da sua.
E dessa
maneira continuou a agir a mulher apaixonada, até que o marido infeliz começou
a perceber que ela, embora o incentivasse a beber, nunca bebia. Por isso, ficou
desconfiado de que as coisas seriam o que de fato eram, ou seja, de que a
mulher o embriagava para poder fazer o que bem quisesse enquanto ele estivesse
dormindo. E, querendo ter uma prova do que acontecia, passou uma vez o dia
inteiro sem nada beber e à noite voltou para casa dando mostras, no jeito de
falar e nos modos, de que era o homem mais embriagado que podia haver; a
mulher, acreditando e achando que ele não precisaria beber mais para dormir
bem, levou-o depressa para a cama. Feito isso, saiu de casa, como era às vezes
hábito seu, e foi para a casa do amante, onde ficou até meia-noite.
Tofano, quando
percebeu que a mulher não estava em casa, levantou-se, foi até a porta, trancou-a
por dentro e ficou à janela, esperando que ela chegasse para deixar bem claro
que tinha percebido seu modo de agir; e ficou lá até que a mulher voltou. Esta,
chegando e vendo- se do lado de fora com a porta trancada, ficou muito aflita e
começou a tentar abrir a porta à força.
Tofano, depois
de aguentar aquilo durante certo tempo, disse:
– Mulher, está
se esforçando à toa, porque aqui não vai poder entrar. Vá, retorne ao lugar
onde esteve até agora e pode ter certeza de que nunca mais vai voltar para cá
enquanto eu não lhe tiver prestado a honra que lhe convém por seus atos, diante
de sua família e dos vizinhos.
A mulher
começou a suplicar pelo amor de Deus que lhe fizesse o favor de abrir, pois não
estava vindo de onde ele achava, e sim da vigília, com uma vizinha, pois as
noites eram longas, e ela não conseguia dormi-las por inteiro nem ficar
acordada em casa sozinha. As súplicas de nada adiantavam, porque aquele burro
estava disposto a fazer que todos os aretinos, que de nada ainda sabiam,
ficassem sabendo de sua vergonha.
A mulher,
vendo que suplicar não adiantava, recorreu a ameaças e disse:
– Se não
abrir, eu vou torná-lo o homem mais infeliz que existe. Tofano respondeu:
– E o que você
poderia fazer?
A mulher, cujo
engenho já fora aguçado pelas inspirações do Amor, respondeu:
– Prefiro me
jogar nesse poço daqui de perto a ter de suportar a vergonha a que você quer me
expor injustamente; e, quando eu for encontrada morta, ninguém vai acreditar
que não foi você que me atirou lá dentro por bebedeira; e assim você vai
precisar fugir e ficar sem nada do que tem, no exílio, ou então vão lhe cortar
a cabeça como meu assassino, que é o que você de fato terá sido.
Com tais
palavras Tofano não se afastou de sua tola decisão. Por isso, a mulher disse: –
Chega, já não
aguento mais esse aborrecimento; Deus que te perdoe; mande pôr no lugar esta
roca que estou deixando aqui.
Estava a noite
tão escura, que uma pessoa mal enxergaria outra na rua, e a mulher, depois de
dizer isso, foi em direção ao poço, pegou uma pedra enorme que havia ao pé do
poço e, gritando “Deus me perdoe”, deixou-a cair lá dentro.
Ao atingir a
água, a pedra fez um tremendo barulho; Tofano, ouvindo, acreditou piamente que
ela havia se atirado; então, pegando o balde com a corda, precipitou-se para
fora de casa a fim de ajudá-la e correu ao poço. A mulher, que estava escondida
perto da porta da casa, assim que o viu correr ao poço, fugiu para dentro,
trancou-se, foi até a janela e começou a dizer:
– A água no
vinho se põe na hora de beber, e não noite alta.
Tofano, ao
ouvi-la, sentiu-se vexado e voltou para a porta; mas, não podendo entrar,
começou a pedir-lhe que abrisse.
Ela, deixando
de lado a fala mansa que usara até então, começou a dizer quase a gritar:
– Pela cruz de
Cristo, bêbado insuportável, você não vai entrar esta noite; não aguento mais
esses seus modos; quero mostrar a todo o mundo quem você é e a que horas volta
para casa à noite.
Tofano, por
outro lado, muito zangado, começou a xingá-la e a gritar. Os vizinhos, ouvindo
o barulho, levantaram-se, e às janelas apareceram homens e mulheres a
perguntarem o que estava acontecendo.
A mulher
começou a dizer chorando:
– É um homem
ruim, que volta bêbado à noite para casa ou fica dormindo nas tavernas e depois
chega a esta hora. Já aguentei muito tempo, mas não adiantou, então, não
suportando mais, quis fazê-lo passar por esse vexame de ficar fora de casa,
para ver se ele se emenda.
Tofano, o
burro, por outro lado, dizia o que havia acontecido e fazia grandes ameaças.
A mulher dizia
aos vizinhos:
– Vejam só que
homem é esse! O que diriam se eu estivesse na rua como ele, e ele estivesse em
casa como eu? Por Deus, duvido que vocês acreditem que ele está falando a
verdade. Por isso já podem conhecer o juízo que ele tem. Está dizendo que eu
fiz exatamente o que eu acho que ele é que fez. Achou que ia me assustar
jogando não sei o que no poço; mas, quisera Deus que ele tivesse se jogado de
verdade e tivesse se afogado, assim o vinho, que ele bebeu de sobra, ficaria
muito bem aguado.
Os vizinhos, homens e mulheres, começaram a
repreender Tofano, a culpá-lo e a xingá-lo pelo que estava dizendo à mulher; e
rapidamente a notícia foi correndo de vizinho em vizinho, até que chegou aos
familiares da mulher. Estes foram até lá e, depois de ouvirem a coisa de um
vizinho e de outro, agarraram Tofano e deram-lhe tamanha surra que o deixaram
moído. Depois entraram na casa, pegaram a mulher e suas coisas e voltaram para
sua própria casa, ameaçando Tofano de fazerem pior. Tofano, vendo-se malparado
e percebendo que o ciúme fora um mau conselheiro, como queria muito bem à
mulher, pediu a alguns amigos que servissem de intermediários, e tanto fez que
conseguiu levar a esposa em paz de volta para casa, prometendo-lhe que nunca
mais seria ciumento; além disso, deu-lhe permissão para fazer tudo o que bem
quisesse, mas com bastante cuidado, para que ele não percebesse. E assim, ao
modo do insensato, depois do prejuízo fez o trato. Viva o amor, morte à guerra,
viva toda a nossa companhia.
Quinta novela da sétima jornada
Quando
Lauretta terminou a sua narração e todos elogiaram a mulher, dizendo que ela
tinha feito muito bem aquilo que convinha ao mau marido, o rei, para não perder
tempo, voltou-se para Fiammetta e lhe impôs amavelmente o encargo de narrar;
assim, ela começou:
– Nobilíssimas
senhoras, a história anterior me traz à mente uma narrativa semelhante sobre um
ciumento, considerando-se que é muito bem-feito o que lhes fazem suas mulheres,
sobretudo quando o ciúme é infundado. E, se os autores das leis tivessem levado
em conta todas as coisas, considero que nisso deveriam ter instituído para as
mulheres a mesma pena que instituíram para todo aquele que fere para se
defender – porque os ciumentos são agressores da vida das jovens senhoras e
buscam diligentemente a morte delas. Elas passam a semana inteira fechadas em
casa, cuidando das tarefas familiares e domésticas, desejando, como todos, ter
nos dias de feriado algum consolo, algum sossego, poder ter algum divertimento,
assim como têm os lavradores nos campos, os artífices nas cidades e aqueles que
dirigem os tribunais, tal como Deus no sétimo dia descansou do seu trabalho e
tal como querem as leis sacras e as civis, que, levando em conta a reverência a
Deus e ao bem comum, distinguiram dias de trabalho e dias de repouso. Mas os
ciumentos não permitem que elas façam nada disso; ao contrário, esses dias,
alegres para as outras, são para elas mais míseros e tristonhos, porque então
os maridos as mantêm mais trancadas e reclusas: a consunção que isso significa
para as pobrezinhas só sabem aquelas que tiveram essa experiência. Por isso,
para concluir, aquilo que uma mulher faz a um marido injustamente ciumento sem
dúvida não deve ser condenado, mas louvado.
Houve em
Rimini um mercador rico de propriedades e dinheiro que tinha uma belíssima
esposa de quem ele se tornou extremamente enciumado; não tinha outra razão para
isso senão a de que, por amá-la muito e achá-la linda, sabendo que ela se empenhava
ao máximo para agradá-lo, acreditava que todos os homens a amavam, que a
achavam bela, e que ela se empenhava para agradar os outros como a ele
(argumento de gente ruim e de pouco sentimento). E, assim enciumado, tomava
tanto cuidado com ela e a mantinha tão vigiada que talvez muitos condenados à
pena capital não sejam guardados com tanta vigilância por seus carcereiros. A
mulher não só não podia ir a casamentos, festas ou igrejas nem pôr os pés para
fora de casa de modo algum como também não ousava debruçar-se a nenhuma janela
nem olhar para fora de casa por razão alguma; por esse motivo, sua vida era
péssima, e aquela tristeza ela suportava com mais impaciência quanto menos
culpada se sentia.
Por isso,
sentindo-se injustamente maltratada pelo marido, para consolar-se imaginou
algum modo – se é que algum modo haveria – de fazer que os maus-tratos tivessem
razão de ser. Como não podia sair à janela e assim não tinha como mostrar-se
contente pelo amor que alguém lhe tivesse demonstrado ao passar pelos
arredores, sabendo que na casa ao lado havia um rapaz belo e agradável,
imaginou que, se houvesse algum buraquinho na parede entre sua casa e a outra,
poderia espiar por ele várias vezes até conseguir enxergar o rapaz e falar com
ele para entregar-lhe o seu amor, caso ele quisesse recebê-lo; e, achando algum
meio, talvez pudesse encontrar-se com ele umas vezes e dessa maneira ir
passando a sua vida infeliz até que o tinhoso desencostasse de seu marido.
E, quando o
marido não estava, olhando a parede da casa ora num lugar, ora noutro,
descobriu por acaso num lugarzinho bastante escondido em que a parede estava um
pouco aberta por uma rachadura; assim, espiando por ela, percebeu que a
rachadura dava para um quarto e pensou: “Se esse fosse o quarto de Filippo (ou
seja, do rapaz vizinho), eu já teria meio caminho andado”. E com cuidado pediu
a uma criada, que tinha muita pena dela, que espiasse, e esta descobriu que,
realmente, o rapaz dormia sozinho naquele quarto. Por isso, ela olhava pela
rachadura com frequência e, quando percebia que o rapaz estava lá, deixava cair
algumas pedrinhas e gravetinhos; assim, tanto fez que, para descobrir o que
acontecia, o rapaz acabou indo até lá. Então ela o chamou em voz baixa, e ele,
reconhecendo a voz, respondeu; ela, quando teve tempo, revelou-lhe todas as
suas intenções. O rapaz ficou tão contente que alargou mais a rachadura do seu
lado, mas de tal modo que ninguém conseguisse perceber: e ali frequentemente
iam para conversar e tocar-se com as mãos, mas não era possível fazer mais que
isso, em virtude da severa vigilância do ciumento.
Como estavam
chegando as festas de fim de ano, a senhora disse ao marido que, por favor,
gostaria de ir na manhã do dia de Natal à igreja para confessar-se e
comungar-se como fazem os outros cristãos. O ciumento disse:
– E que
pecados você cometeu, que quer se confessar?
A mulher
disse:
– Como! Você
acha que sou santa só porque me mantém reclusa? Você sabe muito bem que eu
cometo pecados como todas as outras pessoas que vivem, mas não quero dizer a
você quais são, pois você não é padre.
O ciumento
desconfiou dessas palavras e ficou com vontade de saber que pecados ela teria
cometido, imaginando um meio pelo qual isso pudesse ser feito. Respondeu-lhe,
então, que estava contente com a confissão, mas não queria que ela fosse a
outra igreja senão à capela deles, e queria que ela fosse pela manhã bem
cedinho e se confessasse com o capelão deles ou com algum padre que o capelão
indicasse, e não com outro, voltando imediatamente para casa. A mulher desconfiou
de alguma coisa, mas sem dizer nada respondeu que faria o que ele mandava.
Na manhã do
Natal, a mulher levantou-se com a aurora, aprontou-se e foi para a igreja que o
marido lhe impusera. O ciumento, por sua vez, levantou-se e foi para aquela
mesma igreja, aonde chegou antes dela. Depois de combinar com o padre lá dentro
aquilo que queria fazer, vestiu rapidamente uma das batinas do padre e um
grande capuz de faldas (como os que vemos que os padres usam), que ele puxou um
pouco para a frente do rosto, e foi sentar-se no coro. A mulher chegou à igreja
e solicitou o padre. O padre veio e, ao ouvir da mulher que ela queria se
confessar, disse que não podia ouvi-la, mas que lhe mandaria um companheiro
seu; saiu e mandou o ciumento para a desgraça. Ele apareceu muito solene, e,
embora o dia não fosse muito claro e ele tivesse puxado o capuz bem para a
frente dos olhos, não foi capaz de disfarçar-se tão bem que a mulher não o
reconhecesse imediatamente; quando ela viu aquilo, pensou: “Louvado seja Deus
porque o ciumento virou padre; mas deixe comigo, que eu vou lhe dar o que ele
está procurando”. Fazendo de conta que não o reconhecia, sentou-se aos seus
pés. O senhor ciumento tinha posto algumas pedrinhas na boca, para que estas
lhe atrapalhassem a língua e a mulher não o reconhecesse pela fala, achando que
em todo o resto estava tão bem disfarçado que ela não o reconhecia de modo
algum. Iniciada a confissão, depois de informar que era casada, a mulher disse
entre outras coisas que estava apaixonada por um padre que todas as noites ia
deitar-se com ela.
Ao ouvir isso,
o ciumento teve a impressão de que lhe davam uma facada no coração, e, não
fosse ele dominado pela vontade de saber mais, teria abandonado a confissão e
ido embora. Ficando firme, portanto, perguntou à mulher:
– E como? O
seu marido não dorme com a senhora?
A mulher
respondeu:
– Dorme, sim
senhor.
– Então, como
o padre pode dormir também? – disse o ciumento.
– Senhor –
disse a mulher –, com que artes o padre faz isso eu não sei, mas sei que não há
em casa porta tão fechada que não se abra assim que ele a toque. Diz ele que,
quando chega junto à porta do meu quarto, antes de abri-la, profere algumas
palavras que fazem o meu marido pegar no sono imediatamente e, quando percebe
que ele está dormindo, abre a porta, entra e fica comigo: isso nunca falha.
O ciumento
então disse:
– Minha
senhora, isso está errado, e a senhora precisa deixar definitivamente de
fazê-lo.
A mulher
disse:
– Senhor, acho
que isso eu nunca vou poder fazer, porque o amo muito.
– Então –
disse o ciumento –, não posso absolvê-la. A mulher respondeu:
– Lamento
muito; não vim aqui para contar mentiras; se eu achasse que podia fazer isso,
diria.
O ciumento
disse então:
– Lamento
realmente pela senhora, pois vejo que com essa decisão está pondo sua alma a
perder; mas em seu benefício eu me darei o trabalho de fazer orações especiais
a Deus em seu nome, e talvez elas lhe sejam úteis: de vez em quando vou
enviar-lhe um dos meus coroinhas, e a senhora mandará dizer-me se elas estão
adiantando ou não; e, se adiantarem, continuaremos.
A mulher
disse:
– Senhor, não
faça isso, não mande ninguém à minha casa, porque meu marido é tão ciumento
que, se souber, o mundo inteiro não lhe tirará da cabeça que essa pessoa terá
ido lá com más intenções, e eu não terei paz pelo resto do ano.
O ciumento
disse:
– Não fique
receosa, porque eu farei tudo de tal maneira que a senhora não vai ouvir nunca
nenhuma palavra por parte dele.
Então a mulher
disse:
– Se é isso o
que o senhor tem vontade de fazer, então estou de acordo.
Rezado o confiteor e tomada a
penitência, ela se levantou e foi assistir à missa. O ciumento, com sua
desventura, foi fungando tirar a roupa de padre e voltou para casa, desejando
descobrir uma maneira de encontrar o padre e a mulher juntos, para pregar uma
peça em ambos. A mulher voltou da igreja e viu muito bem no rosto do marido que
lhe estragara o Natal; mas ele fazia o que podia para esconder o que fizera e o
que achava saber.
Decidindo
passar a noite junto à porta da rua à espera do padre, ele disse à mulher:
– Esta noite
preciso jantar e dormir fora; por isso vou fechar bem a porta que dá para a
rua, a do meio da escada e a do quarto, e quando você quiser pode ir dormir.
A mulher
respondeu:
– Está bem.
Ela, assim que
teve ocasião, foi até o buraco, fez o sinal costumeiro e, quando Filippo o
ouviu, foi até lá imediatamente; então a mulher lhe disse aquilo que fizera
pela manhã e o que o marido lhe dissera depois do jantar; depois disse:
– Tenho
certeza de que ele não vai sair de casa, mas vai ficar de guarda junto à porta;
por isso, encontre um jeito de vir esta noite pelo teto, para ficarmos juntos.
O jovem, muito
contente com o fato, disse:
– Senhora,
deixe comigo.
Quando caiu a
noite, o ciumento foi com suas armas esconder-se num quarto do térreo; a mulher
mandou trancar todas as portas, sobretudo a da escada, para que o ciumento não
pudesse subir, e, quando a ocasião pareceu propícia, o rapaz veio
cautelosamente de seu lado; indo para a cama, os dois se propiciaram mutuamente
prazer e bons momentos; quando o dia chegou, o rapaz voltou para casa.
O ciumento,
contrariado, sem jantar e morrendo de frio, passou quase toda a noite com suas
armas ao lado da porta, à espera do padre; quando o dia começou a nascer, não
aguentando mais ficar acordado, adormeceu no quarto térreo. Quando já chegava a
hora terça, levantou-se e, como a porta da casa já estava aberta, fez de conta
que vinha de fora, entrou em casa e comeu. Pouco depois mandou chamar um
rapazinho, como se fosse o coroinha do padre que a confessara, para lhe
perguntar se aquele que ela sabia tinha vindo de novo. A mulher, que reconheceu
muito bem o mensageiro, respondeu que ele não tinha ido naquela noite, e que,
se continuasse assim, talvez ela o tirasse da cabeça, embora não quisesse que
ele lhe saísse da mente.
Que mais posso
dizer? O ciumento passou muitas noites querendo surpreender o padre na entrada,
enquanto o tempo todo a mulher passava bons momentos com o amante. No fim, o
ciumento, que já não aguentava mais, com expressão agastada perguntou à mulher
o que ela dissera ao padre na manhã em que se confessara. A mulher respondeu
que não queria dizer, porque não era coisa decorosa nem decente.
Então o
ciumento disse:
– Sua
ordinária, contra a sua vontade eu fiquei sabendo o que você disse, e é muito
bom você logo dizer quem é o padre por quem está tão apaixonada, aquele que com
suas magias vem dormir com você todas as noites, se não quiser que eu lhe corte
as veias.
A mulher disse
que não era verdade que estivesse apaixonada por padre nenhum.
– Como? –
disse o ciumento. – Você não disse isso ao padre que tomou sua confissão?
A mulher
disse:
– Nem parece
que lhe contaram, parece mesmo é que você estava lá; pois bem, eu disse isso.
– Pois diga
quem é esse padre e já – disse o ciumento.
A mulher
começou a sorrir e disse:
– Fico muito
feliz quando um homem sabido é conduzido por uma mulher simples do mesmo modo
como se conduz um carneiro pelos chifres ao matadouro; se bem que sabido você
não é, e não foi desde o momento em que deixou o espírito maligno do ciúme
entrar no seu peito, sem saber por quê; e quanto mais tolo e burro você for
menor será a minha glória. Você acha, meu marido, que sou cega dos olhos da
cara assim como você é cego dos olhos da mente? Claro que não; logo que olhei
percebi quem era o padre que me confessou, e sei muito bem que era você mesmo;
mas tomei a decisão de lhe dar aquilo que você estava procurando, e dei. Mas,
se você fosse tão sabido como acha que é, não teria tentado saber daquela
maneira os segredos da sua boa mulher e, sem suspeitas vãs, teria percebido que
aquilo que ela lhe confessava era a verdade, sem que ela tivesse cometido
pecado algum. Eu disse que amava um padre: e por acaso você, que não merece o
amor que lhe tenho, não estava disfarçado de padre? Eu disse que nenhuma porta
da minha casa podia ficar fechada quando ele quisesse dormir comigo: e que
porta desta casa alguma vez ficou fechada quando você quis ir aonde eu estava?
Disse que o padre se deitava todas as noites comigo: e quando foi que você não
se deitou comigo? E todas as vezes que você me mandou o seu coroinha, como
sabe, nas vezes em que você não esteve comigo eu disse que o padre não tinha
vindo. Qual o desmiolado, afora você, que se deixou cegar pelo ciúme, não teria
entendido essas coisas? E ficou em casa durante a noite montando guarda junto à
porta e achando que eu acreditei que tinha ido jantar e dormir fora! Emende-se
daqui por diante, volte a ser o homem que costumava ser, não permita que ria de
você quem conhece suas maneiras como eu conheço e deixe de lado essa vigilância
cerrada que me faz; pois juro por Deus que, se me desse vontade de lhe pôr
chifres, mesmo que você tivesse cem olhos, e não dois como tem, eu decidiria
satisfazer à minha vontade de tal modo que você nem perceberia.
O infeliz do
ciumento, que achava ter-se inteirado astutamente do segredo da mulher, ao
ouvir isso sentiu-se envergonhado; e, sem mais nada responder, considerou que
tinha esposa boa e sábia; assim, quando mais precisava do ciúme, despiu-se
dele, tal como o vestira quando dele não precisava. E a sábia senhora, como se
tivesse obtido licença para os seus prazeres, deixou de fazer o amante vir pelo
teto, como fazem os gatos, e este começou a vir pela porta, de modo que, agindo
discretamente, passou depois bons momentos e vida boa com ele.
Parabéns por seu trabalho, ele tem me auxiliado muito.
ResponderExcluirParabéns e sucesso!
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